A Lei 8.666/1993, popularmente conhecida como Lei das Licitações, rege os procedimentos a serem adotados pelo Poder Público para a contratação de serviços e aquisição de bens e tem como objetivo garantir a eficácia dos princípios que gerenciam a administração pública, tais como: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e a eficiência.
Uma vez que a administração possui fins que se consubstanciam na primazia e na defesa do interesse público e desempenha atividades voltadas a essas finalidades, deve-se fazer uso de bens e serviços fornecidos por terceiros, estabelecendo contratos para, por exemplo, realizar obras e benfeitorias, adquirir produtos, alienar seus bens, prestar e executar serviços, entre outros.
Desse modo, para que o poder público firme contratos nesse sentido, a legislação brasileira determinou a observância de um procedimento seletivo prévio que possibilitará a gestão pública à escolha da proposta mais vantajosa e oportuna, qual seja, a licitação.
O ato de licitar refere-se à oferta de algum bem ou serviço à coletividade, para que se atinja o valor mais adequado e plausível, mediante lances.
No âmbito da administração pública, licitar é o processo democrático em que se escolhe prestadores de serviços e/ou fornecedores de bens, observando-se essencialmente os princípios gerais e a primazia do interesse público, logo, é primordial que esse procedimento esteja em conformidade com o critério prescrito pela lei, caso contrário, estar-se-á diante de condutas passíveis de responsabilizações e sanções, tanto na esfera administrativa, quanto cível e criminal. Seja dito de passagem, a própria Lei 8.666/93 regulamenta os crimes e expõe as práticas passíveis de punição.
Entre essas práticas, está a fraude à licitação, enfatizada pelo artigo 90 da mencionada Lei, que se caracteriza pela ação de burlar ou frustrar o caráter competitivo do procedimento licitatório, ou a qualquer ato do mesmo.
Locução intensamente utilizada pelos veículos de comunicação, a fraude em licitação, posto seu viés polêmico, requer atenção em razão da sua dimensão na prática jurídica e no cotidiano dos gestores e de quem contrata com a administração pública.
Essencialmente, há que se analisar a ação do agente ou do contratado com fundamento no que se compreende por licitação, quais os seus fins e motivos. Assim, a ação tipificada exige elemento subjetivo específico, nesse caso, o dolo. Logo, na fraude à licitação, não existe a modalidade culposa.
Ocorre que, a realidade não está de acordo com o que dispõe a lei. Em termos práticos, mesmo que não seja possível a forma culposa no delito citado, há diversas situações pelas quais gestores e contratados (ou licitantes), são investigados e denunciados por fraude em licitação culposa, ao arrepio da lei.
E nessa confusão entre dolo e culpa, até que haja sua devida distinção e sua aplicação, servidores e empresários estão sujeitos a danos praticamente irreversíveis em suas integridades e imagens. Gera-se, por conseguinte, efeitos sucessivos como: exposição indevida de gestores e licitantes, desgaste da máquina pública e desinteresse do particular em contratar com a administração, trazendo não só prejuízos as partes diretamente envolvidas, como a sociedade de modo geral que toma posse muitas vezes de informações deturpadas.
*Vinicius Segatto é advogado, pós-graduado em Direito Constitucional, Direito Eleitoral e Improbidade Administrativa, pós-graduando em Direito Penal e Processo Penal, membro do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais e da Comissão de Direito Penal e Processo Penal da OAB-MT