Sábado, 12 de Outubro de 2024

ARTIGOS Segunda-feira, 03 de Setembro de 2018, 10:31 - A | A

Segunda-feira, 03 de Setembro de 2018, 10h:31 - A | A

Simples assim

Pedro Flory

Simples assim.

 

Vivemos na era do “simples assim”. Marca registrada da nossa época em que se procura e difunde informação da forma mais célere (e rasa) possível. Violência? Basta liberar armas de fogo, simples assim! Dívidas? Basta excluir o nome do inadimplente dos órgãos de proteção ao crédito, simples assim! Imigração de Venezuelanos? Fecha-se a fronteira, simples assim!    

 

Muitos impostos? Corte de tributos, claro. Simples assim! Tudo está muito fácil. Todos têm respostas para questões extremamente complexas. Os exemplos acima são apenas fragmentos de um problema maior, o da simplificação do conhecimento.

 

Pesquisa de 2016 constatou que 30% dos brasileiros nunca comprou um livro e 44% não tem o hábito de ler. Não estamos falando de clássicos da literatura. Provável que uma quantidade mínima da população se interesse por Doistoiévski, Tolstói, García Marques ou Cortázar, mas por que não se aprofundar na busca daquilo que é fundamental para o país.    

 

As pessoas se tornam especialistas em questões complexas como política, direito e economia após ler meia dúzia de postagens nas redes sociais (o número de pessoas graduadas pelo Facebook e Twitter é assustador).

 

O pior, a obtenção das informações é feita sem critério e preocupação quanto à sua veracidade. Basta que o texto corrobore com aquilo que se pensa para que seja compartilhado à exaustão. Qual a razão de passar anos na faculdade, e nas inúmeras extensões universitárias, se a resposta para tudo está logo ali, a apenas um clique de distância?  

 

Em ano eleitoral, essa mágica do conhecimento instantâneo é ainda mais preocupante, porque define o futuro de milhões de pessoas. É possível que essa seja a primeira eleição a ser decidida na internet. Se ela não for o maior veículo de obtenção de votos, será, certamente, decisiva para cativar parte significativa do eleitorado.  

 

Vejo colegas defendendo ferrenhamente o candidato A ou B, sem nunca ter sequer ouvido uma entrevista de mais de 30 segundos do político em questão ou lido o respectivo plano de governo. Basta que defenda algum ponto convergente com seu pensamento e pronto.  

 

Voto garantido! Ocorre que o buraco é mais embaixo. O próximo presidente/governador ficará no governo ao menos por quatro anos (vamos excluir por ora a possibilidade de impeachment ou renúncia). Esse tempo é suficiente para afundar ainda mais o país. Já vivemos em uma nação com mais de 13 milhões de desempregados e quase 60.000 homicídios por ano. Está bom ou querem mais?  

 

Enfim, vivemos a era em que todos têm opinião sobre tudo, mas não se aprofundam em nada. As pessoas se dizem de esquerda, direita, liberais, conservadores, sem ao menos saber o real.  

 

Simples assim.

 

direita, liberais, conservadores, sem ao menos saber o real significado dessas palavras. Partidos políticos vistos como antagônicos são mesmo tão diferentes? Aqueles políticos vistos como “outsiders” são, de fato, pessoas de fora da política ou já estão no meio há décadas?

 

Temo que um grande contingente de eleitores vai à urna eletrônica munido apenas do conhecimento obtido nas redes sociais, fato que pode vir a ser catastrófico. A solução? Mais estudo, mais leitura e mais humildade para perceber que quanto mais sabemos, mais evidente fica nossa ignorância. Simples assim.

 

Pedro Flory Diniz Nogueira - Juiz Titular da 3ª Vara Criminal de Juara/MT