No olhar sereno e na fala pausada do policial militar aposentado, professor e escritor Nelson de Carvalho, conhecido pela corporação como Sub Carvalho, o tempo parece sempre carregar duas dimensões: o peso da farda que o acompanhou por mais de três décadas e a leveza dos versos que hoje dão forma às emoções que moldaram sua história. Aos 31 anos dedicados à corporação, Nelson nunca imaginou que, após a aposentadoria, reencontraria um novo propósito justamente no lugar onde acreditou ter encerrado um ciclo.
“Eu trabalhei na polícia por 31 anos. Quando me aposentei, fiquei 10 anos longe da rotina militar. Depois, fui chamado novamente, reintegrado ao Batalhão Rotam, onde hoje atuo como supervisor dos projetos sociais. Agradeço imensamente aos sargentos Juniel Padilha e Vitor Paz pelo convite e indicação para retornar e cumprir nobre missão. Fico feliz em ser acolhido no Batalhão Rotam como parte integrante de uma grande família.”
No batalhão, Nelson se transformou em referência dentro do Grêmio Rotam, espaço que coordena ações voltadas ao esporte e à assistência aos policiais, mas que também se tornou ponte para algo maior.
“Temos dois projetos: o jiu-jitsu e o futebol. Atendemos 300 crianças em cada modalidade”, explica, com o brilho de quem encontrou no cuidado com a juventude parte essencial de sua missão. Crianças e adolescentes entre 7 e 16 anos recebem orientação esportiva, mas, sobretudo, valores. “Trabalhamos com base no Provérbio 22:6: guiar os meninos no caminho em que devem andar. A prioridade não é formar craques, mas formar homens voltados ao bem.”
Foi às vésperas da aposentadoria que surgiu outro chamado: o da escrita. Incentivado por colegas do quartel, Nelson lançou seu primeiro livro, Universo, composto por poesias que retratam o cotidiano, a espiritualidade, o amor e, principalmente, a dor que nunca esqueceu: a perda do irmão, o 3º sargento Luiz Fernando de Carvalho, morto em ação na década de 1980. “Não tenho pretensão de ser chamado poeta. Dom é coisa inata. Mas, quando junto palavras, me esforço para formar rimas e versos significativos”, disse Nelson, afirmando que aproximadamente mil livros foram produzidos. Somente no dia do evento de lançamento, foram vendidos 800 exemplares da obra.
Hoje, com cerca de 900 poemas escritos e revisados, ele prepara um segundo livro. “As poesias são mais profundas, mais para dentro. Falam com o coração. São sentimentais, inspiradas por Deus e pelos acontecimentos do dia a dia.”
Entre todos os seus escritos, há um que Nelson carrega como uma cicatriz que, embora feche, nunca desaparece. Tributo a um Guerreiro nasceu no chão de um cemitério, sobre um pedaço de papel de cimento, escrito com uma caneta emprestada, enquanto lavava o túmulo do irmão. Ele recorda com voz firme, mas embargada: “Tive lapsos de memória por quatro meses após a morte dele. Quando voltei ao cemitério, senti uma inspiração tão grande que precisei escrever.”
E então surgiram versos que, anos mais tarde, emocionariam até pessoas desconhecidas, como uma mulher da Bahia que pediu autorização para usar o poema em seu TCC.
O trecho a seguir, solicitado por Nelson, revela o coração aberto de quem transformou dor em arte: “Venci, meu Deus, os preconceitos que atormentavam o meu ser, aprendi a conviver com meus defeitos, distinguindo o querer do não poder. Aprendi, Senhor, que a vida é controlada pelo vosso querer; às vezes torna-se sofrida, porém algo fizemos por merecer. Queria tanto que estivesse hoje aqui, comigo agora, e me explicasse, se desse, por que tão cedo foi embora. Que adianta ter uma vida que esperança não nos traz? É tentarmos ir à frente caminhando para trás.”
Pai presente, avô dedicado e marido companheiro, Nelson fala com carinho dos filhos e da neta de oito anos, Eloá, que cria como filha. O segundo livro já está em fase de organização e deve ser lançado no próximo ano, dependendo de patrocínios culturais. A sargento Jucá, presidente do Grêmio Rotam, tem ajudado na busca por apoio institucional. “A ideia é ter um livro novo, com poesias que tocam o coração. E, quando formos lançar, você me avisa, porque queremos chamar a imprensa para cobrir.”
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