Domingo, 05 de Maio de 2024

ARTIGOS Sábado, 21 de Janeiro de 2023, 08:39 - A | A

Sábado, 21 de Janeiro de 2023, 08h:39 - A | A

Glaucia Amaral

"Nenhuma a menos, todas as vezes"

Todas as vezes temos visto uma mulher a menos, uma amiga, uma irmã, uma mãe, uma pessoa inocente a menos. 
 
Nenhuma a menos é uma frase que movimentos pelos direitos das mulheres utilizam para simbolizar o que não podemos admitir: a perda de uma mulher para a violência. 
 
Para simbolizar que nós estamos atentas umas às outras, como companheiras, suscetíveis aos mesmos tipos de crimes e discriminações. Mas temos muitas a menos. Perdemos muitas para o feminicídio e tantos outros males que atingem as mulheres como grupo social. 
 

A cada mulher vítima de feminicídio, observo pessoas consternadas, mas muitas ainda em negação do termo, e da óbvia repetição das mesmas características do crime.   

Mas já passou da hora da outra metade da humanidade se conscientizar, e vir para o lado de quem exige nenhuma a menos. 
 
A modificação estrutural só ocorrerá com o engajamento de toda a sociedade. Especialmente, os homens. Cuja principal missão hoje é a de refletir acerca do que seja, para ele mesmo, a sua masculinidade. 
 
Não sou partidária do termo masculinidade tóxica. Muito embora ela exista, no abuso, na violência, no preconceito, no menosprezo da capacidade feminina.

Sentimentos e situações que levam à despersoniificação das mulheres que com ele convivem, ferindo muitas vezes à ponto de matar.

Sou partidária de que os homens, especialmente, os que se propõem à uma nova e melhor convivência com as mulheres, reflitam sobre si mesmos. A ponto de detectarem se não vinculam a fidelidade de suas parceiras, por exemplo, à sua essência de ser homem [como boa parte dos feminicidas].

Que reflitam sobre si mesmos, para verificar se não vinculam a ideia de sentirem-se menos homens, em fim de relacionamento. Se têm capacidade de perceber que sua vida continua íntegra, mesmo que sua mulher deseje o fim. 
 
Para tanto, devemos incentivar a existência dos grupos reflexivos, de homens, para que entre si reflitam e se tornem independentes de preconceitos herdados. Tarefa para o Poder Público que já vem colocando em prática no Judiciário e aqui, em Mato Grosso, na PM. Como é também deveria ser uma tarefa para as empresas, que podem ganhar muito com o fim do assédio e em produtividade, num ambiente mais saudável. 
 
A cada mulher vítima de feminicídio, observo pessoas consternadas, mas muitas ainda em negação do termo, e da óbvia repetição das mesmas características do crime. 
 
Sem conscientização não haverá mudança. 
 
Observo o Poder Judiciário e o Poder Executivo, por meio da segurança pública e assistência social, discutindo, aperfeiçoando e modificando cada fase de atendimento após denúncias. Isso é necessário.

Mas é preciso atacar a raiz cultural. Pois esse crime se baseia em um preconceito histórico, quanto aos papéis do homem e da mulher. Atinge ricos e pobres. Cultos e sem conhecimento formal. E perpassa religião e é totalmente indiferente à cor. E, pior, destroem famílias. Lutamos para socorrer os órfãos do feminicídio. 
 
Assim, é preciso nos comprometer em atacar a causa. 
 
Nenhuma a menos. Mas só ontem em Mato Grosso foram duas mulheres a menos.
 
Glaucia Amaral é presidente da Comissão da Mulher Advogada da Ordem dos Advogados do Brasil - Seccional Mato Grosso (OAB-MT)