A Proposta de Emenda Constitucional[PEC] Pacto Federativo, que integra um conjunto de reformas elaboradas pelo Plano Mais Brasil, apresentado pelo presidente pesselista, Jair Bolsonaro, no Senado Federal na última terça-feira (5), não para de causar indignação aos agentes políticos brasileiros e, em particular, em Mato Grosso.
Durante toda a semana, a PEC conseguiu ganhar o repúdio não só dos oposicionistas como de parlamentares simpáticos à Bolsonaro. A medida propõe a extinção de 1.254 municípios no país com menos de 5 mil habitantes e arrecadação própria inferior a 10% da receita total serão incorporados pelo município vizinho. Caso seja aprovada, a incorporação dos municípios extintos valerá a partir de 2026, e caberá a uma lei complementar definir qual município vizinho absorverá a prefeitura deficitária.
“A medida propõe a extinção de 1.254 municípios no país com menos de 5 mil habitantes e arrecadação própria inferior a 10% da receita total serão incorporados pelo município vizinho”
Em Mato Grosso, pelo mennos 34 cidades podem entrar na lista com a fusão de municípios, devida a baixa sustentabilidade financeira sugerida pelo Governo Federal. Na análise do deputado estadual petista Lúdio Cabral, a PEC, no entanto, 'não passaria de uma cortina de fumaça para esconder maldades bem maiores que estão dentro de outros projetos'.
"Uma especie de boi de piranha, uma cortina e fumaça para que depertar atenção, enquanto outros projetos são encaminhados, especialmente, aquele que reduz o volume de recursos disponíveis para saúde, educação e assistência social".
Para o parlamentar petista, o debate sobre redução do número de municípios, precisa considerar a realidade de cada estado. E que, sobretudo, a população destes Estados precisam opinar. Pontuando que para a criação de um município é necessário plebiscito, além de uma série de questões que precisam ser atendidas. "Diante deste cenário, é preciso que haja uma discussão com a população, pois é ela que precisa dizer se é favorável ou não".
A repercussão da PEC foi acolhida igualmente de forma negativa pelo presidente do Legislativo estadual, o deputado democrata Eduardo Botelho, que avaliou que a proposta, se for aprovada, pode ter um impacto muito grande em Mato Grosso. “Os deputados já estão preocupados. É muito ruim, nós lutamos para abrir estes municípios. Acabar com estes municípios é um projeto ruim para Mato Grosso”, afirmou.
Em conversa com jornalistas esta semana, Botelho ainda alertou sobre a necessidade da criação de uma força-tarefa junto à bancada federal de Mato Grosso e de governadores para não deixar a ideia prosperar. “Temos que mobilizar a bancada federal e conversar com governadores. Acho que isso não vai prosperar no Congresso. Tenho essa convicção pois o impacto será muito grande. Lutamos para criar esses municípios que já estão estruturados, funcionando e acabar com eles, hoje, seria um retrocesso. Acredito que o Congresso vai ter sensatez, sensibilidade e não vai aprovar isso”, afirmou o presidente.
Um dos 34 municípios que pode ser extinto em Mato Grosso é o de Rondolândia (1.062 km de Cuiabá), que, segundo estimativa do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) tem 4.001 habitantes.
E de acordo com a deputada estadual Janaína Riva (MDB), 1ª vice-presidente da ALMT, a cidade tem estradas precárias, que dificultam o acesso e as cidades vizinhas, às quais poderia ser anexada, são Aripuanã, distante 800 km por estrada de chão, e Comodoro, que fica a 500 km.
“Se deixar de ser município como o projeto propõe, corre o risco de que as pessoas que ali vivem saiam na miséria”, disse a deputada, se referindo a desvalorização dos imóveis caso a pessoa decida vender a residência e se mude dali. Segundo Janaína, a responsabilidade pela criação destes municípios foi da Assembleia Legislativa e dos governos “que de certa forma consentiram”.
Por isso, avalia a deputada, não é justo que pessoas que acreditaram que a cidade fosse crescer, e trabalharam para isso, fomentando a economia, abrindo seu comércio, fiquem agora com o “prejuízo”. “Eu acho não é justo que a responsabilidade financeira, o impacto todo fique com o cidadão”, avaliou a deputada.
Ainda ao repudiar a proposta em suas redes sociais, a deputada emedebista lembrou que se houve irregularidades na emancipação dos municípios que se tornaram alvos da medida do governo federal, a "responsabilidade é da Assembleia Legislativa e também dos governos que de certa forma consentiram com isso. Assim, esse prejuízo não pode ser exclusivamente daqueles que acreditando neste processo de emancipação da cidade, realizaram um trabalho sério, fomentando seu crescimento, sua economia, seu comércio. E agora terá que arcar, após todas estas lutas, com o impacto financeiro".
No dia em que a PEC foi anunciada, o deputado petista Valdir Barranco foi um dos primeiros na Assembleia Legislativa a abrir o coro dos descontentes e se pronunciar contra a proposta. Revelando que a resolução de Bolsonaro sobre a redução de municípios veio, literalmente, para rasgar a Constituição. Ao lembrar que foi a partir da construção da Constituição Federal de 1.988, que ocorreu a ampliação na criação de municípios no Brasil.
“Resolução de Bolsonaro sobre a redução de municípios veio, literalmente, para rasgar a Constituição, diz Barranco”
"No Brasil, na década de 50 [do século 20], o Brasil tinha um pouco mais de mil municípios. Com as novas regras estas cidades puderam ser ampliadas e o país chegou até 1.988, a 5.570 municípios, à partir da nova Constituição que estabeleceu novas regras, possibilitando o surgimento de mais cidades no Brasil. Agora, o presidente quer simplesmente retroagir no tempo e mudar estas regras. A legislação é clara, você só retroage para beneficiar municípios, não para prejudica-los".
Um pouco mais tarde, o deputado federal por Mato Grosso, o emedebista Carlos Bezerra contestou, igualmente, a extinção de municípios. Em almoço em Brasília, realizado pela bancada do MDB nacional, com a presença do ministro da Secretaria de Governo, general Luiz Eduardo Ramos, o parlamentar se pronunciou contra a proposta e recebeu o apoio do partido.
Indignado com a proposta de Bolsonaro, o presidente da Associação Mato-grossense dos Municípios, Neurilan Fraga ressaltou que o Governo deixou de colocar na cesta das receitas o ICMS e o Fundo de Participação dos Municípios, que entram no orçamento das prefeituras. Do bolo do ICMS, os municípios ficam com 25% da arrecadação e recebem o FPM é composto pelo IPI e o Imposto de Renda.
Ainda disse que, se considerar apenas as receitas IPTU, ISS e ITBI, um número significativo de municípios não afere os 10% da receita total. Ele frisou, ainda, que existem capitais que atingem a receita total com a arrecadação própria.
A previsão do Governo Federal é que as três PECs do Plano Mais Brasil sejam votadas nos dois turnos na Câmara e no Senado, até o final do primeiro semestre do próximo ano. De acordo com o ministro da Economia, Paulo Guedes, o pacote de medidas vai fortalecer a democracia ao possibilitar, por exemplo, a descentralização de recursos da União para que os demais poderes tenham autonomia no manejo desse dinheiro. A expectativa do governo é de que, com as propostas, estados e municípios recebam entre R$ 450 bilhões e R$ 500 bilhões nos próximos anos.
Veja vídeo