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POLÍTICA Quarta-feira, 03 de Abril de 2019, 17:09 - A | A

Quarta-feira, 03 de Abril de 2019, 17h:09 - A | A

POLÊMICA

Prefeitura de Rondonópolis é acusada de racismo institucional em campanha de limpeza

Alexandra Freire - O Bom da Notícia

A campanha “Cidade Limpa, qualidade de vida e povo feliz”, da Prefeitura de Rondonópolis (a 212 quilômetros de Cuiabá), lançada em 21 de fevereiro, está sendo acusada de racismo institucional pela Unegro Pantanal. 

 

Ela não só desqualifica como fere a dignidade do negro e da negra. Ferido também o artigo I da constituição Federal. Que tem como um dos fundamentos a dignidade da pessoa humana

Na mídia imprensa - disponibilizada para propaganda “educativa” -, aparecem dois personagens: o Limpinho e o Sujismundo. O Limpinho seria um cidadão branco e Sujismundo um negro. A cartilha traz os seguintes dizeres: 

 

“Não tive chance com a cidade limpa, não tenho espaço para sujar”, diz o Sujismundo. Já o Limpinho comemora: “ juntos, venceremos o Sujismundo!”

 

Para Luzia Aparecida do Nascimento, presidente da Unegro e Conselheira Estadual da Igualdade Racial no município, a campanha é estereotipada e coloca o negro como sujo, relaxado com sua própria casa e com sua cidade.

 

“Ela não só desqualifica como fere a dignidade do negro e da negra. Ferido também o artigo I da constituição Federal. Que tem como um dos fundamentos a dignidade da pessoa humana”, disse Luzia ao site O Bom da Notícia nesta quarta-feira (3).

Divulgação

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Luzia esteve nesta quarta-feira(03), na Câmara de Rondonópolis, para denunciar a propaganda. Ela também recebeu denúncias de outras pessoas sobre o caso.

 

Ao site, ela informou que os vereadores cobraram uma manifestação do prefeito Zé Carlos do Pátio (Solidariedade). “ De modo especial o vereador Adonias Fernandes (MDB) pediu que a prefeitura fizesse a retratação pública nos meios de comunicação”, disse. 


Em nota de repúdio a Unegro diz que "associar a imagem do negro como sujo, descuidado e sem higiene é sim uma atitude racista tão naturalizada a ponto de uma instituição pública como uma prefeitura, fazer uma campanha em nível municipal, sem pensar nas consequências de tal atitude para população negra". Confira a nota na íntegra abaixo.

 

O psicólogo Douglas Amorim conversou com o O Bom da Notícia sobre os impactos que este tipo propaganda pode causar. Conforme ele, a representatividade é importante para qualquer idade, e mais, para qualquer grupo minoritário.

 

“No caso das crianças que estão formando sua autoimagem, construindo sua identidade, a representação de si mesmas, de suas características mais marcantes, como cor da pele, cabelo, forma física, é imprescindível que seja construído de uma forma positiva”, explicou Douglas. 


Nessa linha de discussão, o psicólogo explica que associar a cor da pele com sujeira faz com que uma criança, por exemplo, entenda que a cor da pele negra seja algo ruim", continua.

Reprodução/Web

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“Quando isso de modo negativo, impactamos negativamente a forma como estas crianças se veem. Pois associaram a forma como foi mostrado a elas, como são vistas, com a forma como se veem. O olhar do outro se confunde com o delas. Associar a cor da pele a sujeira, por exemplo, faz com que a criança entenda que a cor da pele escura seja algo ruim. E toda sua perspectiva será construída dessa forma. A mensagem que estamos dando é que ela deveria combater aquilo que ela mesma é”, conclui.

 

O coordenador de comunicação da Prefeitura de Rondonópolis, Cleomar Pilar, afirma que o personagem “Sujismundo” não é negro. Argumenta que e o personagem está empoeirado. Veja o vídeo de Cleomar no final da matéria - entrevista Record TV falando sobre o assunto. 

 

“Nós aqui de Rondonópolis, temos um tom de pele mais negro, né. Até por causa da nossa descendência, que muito nos honra, que muito nos orgulha, do nosso tom de pele. É um povo incomparável com outros locais, outras regiões do pais. Em relação a isso, nós tomamos muito cuidado ao elaborar esse material, tanto que distribuímos personagens igualitariamente. No caso do Sujismundo, ele não é uma pessoa negra. Ele está empoeirado. Veja vídeo.

 

NOTA DE REPÚDIO

 

A UNEGRO PANTANAL RONDONÓPOLIS vem a público repudiar veementemente a forma racista imputada aos negros e negras na produção de material impresso da Prefeitura de Rondonópolis em campanha publicitária com cunho educativo.

É que a primeira etapa da campanha denominada Cidade Limpa realizada pela Prefeitura estampa em um panfleto dois personagens, onde o negro é caracterizado como sujo e o outro, branco, onde afirma que é o limpo.

 

Na parte superior do impresso um jovem branco tem as seguintes frases no balão: “Oi! Eu sou Limpinho. Estamos limpando e gramando as áreas públicas”. Na parte inferior, do mesmo panfleto, um jovem negro (em imagem retirada na internet, do doloroso e excludente período da ditadura militar) com os seguintes dizeres: “Eu sou o Sujismundo”, “Eu jogo lixo em todas as partes.  Eu não cuido da minha casa e nem da minha cidade”.

A imagem altamente racista humilha e desqualifica a população negra deste município, que tem importantes contribuições na construção desta cidade. Causa espanto e revolta porque esta mesma população negra tem respeito pela gestão atual, que já se mostrou sensível a luta contra a exclusão e ao abandono relegado aos negros e negras por tantos anos.

 

Enfatizamos que não toleramos mais o racismo e, de forma especial, o racismo institucional. A legislação é bem explícita nesse sentido: racismo é crime.

 

Associar a imagem do negro como sujo, descuidado e sem higiene é sim uma atitude racista tão naturalizada a ponto de uma instituição publica como uma prefeitura fazer uma campanha em nível municipal sem pensar nas conseqüências de tal atitude para população negra.

 

Imagina as crianças negras, o que devem estar vivenciando de bullyng e racismo nas escolas por conta desta campanha? Não se pode criar uma campanha desse porte desqualificando uma etnia pela cor da pele.

 

Os negros e negras deste município exigem respeito e e uma reparação por parte da Prefeitura de Rondonópolis. Queremos acreditar que o pefeito José Carlos Junqueira não compactua com tal ofensa à população negra porque, se assim for, teremos que recorrer ao Ministério Público para que faça valer a lei.

 

A Constituição Brasileira traz em seu artigo primeiro o compromisso com o princípio da igualdade e da dignidade da pessoa humana. Ao cometer tal discriminação, o município fere a dignidade dos negros e negras deste Município. É, no mínimo, revoltante. A UNEGRO não pode e não vai compactuar com essa forma de campanha no Município de Rondonópolis.

 

 Rondonópolis-MT, 02 de abril de 2019

Assinam:

Luzia Aparecida do Nascimento

Presidente da Unegro e

Conselheira Estadual da Igualdade Racial

Rosana Pereira de Brito

Coordenadora de Religião de Matriz Africana da Unegro

Conselheira Municipal do Conselho da Igualdade Racial

Tiago Campos

Secretário da UNEGRO

Crys Porto

Coordenadora do Conselho Fiscal da UNEGRO

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