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ARTIGOS Domingo, 28 de Março de 2021, 13:17 - A | A

Domingo, 28 de Março de 2021, 13h:17 - A | A

Fabrício Fraga

100 anos de Barbosa; e o estigma do goleiro negro

(Foto: Divulgação)

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 Moacir Barbosa Nascimento

No dia 27 de março de 1921, há exatamente 100 anos, nascia em Campinas, São Paulo, Moacir Barbosa Nascimento, um dos maiores goleiros da história do futebol brasileiro.

Barbosa, teve o auge de sua carreira futebolística no Clube de Regatas Vasco da Gama, no final da década de 40 e meados da de 50, conquistando o Campeonato Sul Americano de 1948, sendo o melhor goleiro das Américas. E mesmo quando se comemora seu centenário, registrado neste último sábado, é grandioso lembrar que mesmo sendo uma referência, Barbosa também é lembrado por uma das maiores injustiças da história do futebol.

Servindo a Seleção Brasileira, foi goleiro titular na Copa do Mundo de 1950, realizada no Brasil. E foi considerado por muitos, o culpado da derrota na final do mundial, por uma suposta falha no gol do uruguaio Alcides Ghiggia, que decretou a equipe celeste, campeã do mundo daquele ano, no jogo conhecido como "Maracanaço". Barbosa carregou essa culpa por toda sua vida, e a partir dessa injustiça, nasceu o estigma do goleiro negro, baseado e forjado - único e exclusivamente -, pelo racismo estrutural.

Servindo a Seleção Brasileira, Barbosa foi goleiro titular na Copa do Mundo de 1950, realizada no Brasil. E foi considerado por muitos, o culpado da derrota na final do mundial, por uma suposta falha no gol do uruguaio Alcides Ghiggia.

Desde o gol de Ghiggia, até os dias atuais, goleiros negros não são "confiáveis", por conta da falha atribuída a Barbosa. Durante anos, a vilania pesada que caía sobre os ombros do goleiro cruzmaltino, fez com que goleiros negros, ainda que considerados bons pegadores e talentosos, possuíam estrutura psicológica duvidável e que, no momento crucial de uma partida, na hora "h", ele vai falhar.

Essa visão estrutural do racismo, não atribuiu a um jogador específico que joga em baixo das balizas, uma possível falha num jogo. Mas, sim, a um goleiro negro, que depois virou sinônimo de fracasso e de derrota. O fato de Barbosa ser negro (apesar de todo seu talento), colocou em todos os goleiros da mesma cor, a prerrogativa da falha.

Isso causa consequências até hoje, desde as dificuldades para assinar contratos, até a enorme desconfiança de dirigentes, técnicos e torcedores, quando um goleiro negro alcança a titularidade de uma equipe. Não há relatos semelhantes de acusações e culpabilidade do mesmo nível, em falhas de goleiros brancos. Isso é estrutural.

Tal consequência se dá, ao fato, que após isso poucos goleiros negros surgiram, num país onde há um expressivo número (hoje, a maioria) de pretos e pardos. Coincidência? Será que várias crianças à época, que queriam "agarrar no gol", não foram suprimidas por seus pais ou responsáveis por conta do estigma criado em torno de Barbosa? Será que podemos usar o exemplo dessa estrutura racista em outras profissões no Brasil em dias atuais?

Que nestes 100 anos do nascimento de Barbosa, possamos fazer algumas reflexões, como forma de até virarmos ‘essa página vilã’, contra um dos maiores e mais vitoriosos goleiros de todos os tempos.

Temos que reverenciar o ‘Seu Moacir’ como um vitorioso, um ser humano ímpar, pois carregar sozinho um peso desses nas costas, uma condenação injusta e maligna dessas, por onde ia, por onde passava, em todos os lugares, por toda a sua vida, não deve ter sido fácil, com certeza.

Homenagens e dedicatórias serão muito bem-vindas a ele mas, sem dúvida alguma, o que seria muito justo, era um pedido sincero de desculpas e perdão, não só pelos clubes de futebol mas, de todos brasileiros. Então, quero fazer a minha parte: perdão Barbosa! 

Fabrício Fraga é profissional de Educação Física, especialista em Educação a Distância e professor tutor do curso de Educação Física da Unip - Universidade Paulista – Polo Av. do CPA – Cuiabá