Desde que o Projeto de Lei 668/2019, que visa regulamentar a atividade pesqueira no estado, foi apresentado na Assembleia Legislativa, em junho deste ano, um amplo debate acompanha a tramitação da proposta. De autoria do governo estadual, o projeto tem o intuito de estabelecer regras para a exploração sustentável da pesca de Mato Grosso, com objetivo de recuperar o estoque pesqueiro e fomentar a pesca esportiva.
A proposta, conhecida como “Cota Zero”, tem entre suas principais definições a proibição do transporte, do armazenamento e da comercialização do pescado oriundo dos rios de Mato Grosso por um período de cinco anos, a contar de janeiro de 2020. O ponto é polêmico porque impacta diretamente na estrutura econômica de diversos municípios e regiões ribeirinhas do estado.
O texto original já foi analisado pela comissão de mérito e agora a Casa aguarda uma posição do Poder Executivo sobre a possibilidade de ampliar os estudos e quer ouvir a secretária estadual de Meio Ambiente, Mauren Lazzaretti. Ela deve apresentar o embasamento técnico do projeto, para então os parlamentares se posicionarem quanto à proposta. A data em que a secretária será ouvida ainda vai ser definida.
O presidente da ALMT, Eduardo Botelho (DEM), já declarou que o projeto não será votado este ano. “É preciso concluir os estudos e analisar os resultados”, explica.
Considerando os possíveis impactos sociais, culturais e econômicos da restrição sobre os pescadores artesanais e setores dependentes da cadeia econômica de pesca, a Assembleia Legislativa, quando recebeu o projeto, estabeleceu uma agenda intensa de audiências para conhecer melhor a realidade, ouvir a demanda da população e discutir possíveis melhorias no projeto antes de iniciar a votação.
Uma comissão parlamentar também foi formada para discutir e elaborar um relatório mais preciso sobre os impactos e a viabilidade do projeto. Formada pelos deputados Wilson Santos (PSDB), Ondanir Bortolini – Nininho (PSD), Janaina Riva (MDB), Dr. Eugênio (PSB), Elizeu Nascimento (DC) e Paulo Araújo (PP), sob a presidência de Dilmar Dal Bosco (DEM), ela deve concluir os trabalhos em 2020 para então iniciar a votação. “Só o relatório do Executivo não é suficiente, por isso a Assembleia vai fazer esse estudo e colocar nas mãos dos deputados para que eles possam votar”, afirmou Botelho.
“Essa é uma questão muito séria que impacta no direito das pessoas que vivem da pesca tanto para subsistência como para fonte de renda. Isso sem falar das tradições”, destaca o deputado Elizeu Nascimento (DC). Autor de dois substitutivos integrais, ele é um dos parlamentares à frente das discussões. Elizeu defende a necessidade de considerar a realidade e as reivindicações das comunidades que vivem da pesca antes de votar o projeto. “A suspensão da pesca vai comprometer toda estrutura econômica local. Desde os pescadores, o comércio e vários outros prestadores de serviço que têm sua atividade econômica atrelada à pesca. Tem muita coisa para considerar, que o projeto não está contemplando”, explica.
A falta de um estudo mais amplo, por parte do Poder Executivo, que apresente dados mais precisos sobre o número de pescadores profissionais e amadores em Mato Grosso, quantifique os turistas que vêm praticar a pesca esportiva e detalhe as espécies de peixe em extinção, é um dos principais pontos levantados nos debates até agora. Além da falta de uma definição mais clara quanto às medidas de suporte para quem vive exclusivamente da pesca e, ainda, a falta de um levantamento sobre o número de beneficiários do seguro-defeso.
O presidente da Colônia de Pescadores Z1, Antônio José da Silva, disse que a classe está muita receosa com o projeto. “A preservação é importante e nós somos os mais preocupados em ter os peixes no rio. Mas a proposta não está considerando o impacto dessa proibição para quem vive da pesca e precisa de uma alternativa para diminuir ou parar com a atividade”, critica. Segundo, ele é preciso considerar que média de idade dos pescadores é de 50 anos e muitos não têm formação.
“Impedir os pescadores de trabalhar naquilo que sabem e já fazem a vida toda é preocupante. Nós dependemos disso para viver e o governo não fala o que vai ser feito pelos pescadores durante esse período. Essa é a maior preocupação”, defende.
Antônio destaca ainda que as audiências estão garantindo a oportunidade da classe se pronunciar e expressar as preocupações. “A associação está acompanhando de perto e buscando o diálogo para a construção de uma proposta que ajude na preservação dos peixes, sem gerar prejuízos à vida das comunidades. Nós vivemos na beira do rio, conhecemos as dificuldades e podemos ajudar a melhorar. Só queremos participar dessas decisões que vão mudar as coisas para nós”, afirma.
O deputado Elizeu Nascimento defende uma proposta com mais estudo e definições mais claras tanto das ações de preservação quanto das políticas voltadas para os pescadores. “O período de cinco anos é muito tempo. Acredito que devemos pensar em medidas diferentes para melhorar a quantidade de peixes nos rios e não pensar em uma política voltada para atender uma classe mais favorecida em prejuízo daqueles que vivem da pesca”, defende.
Dentre as propostas apresentadas pelo parlamentar, estão algumas mudanças na restrição de pesca, o repovoamento de alevinos, o rodízio de pescado e o aumento na fiscalização.
Para a implantação das medidas, ele sugere, entre outras propostas, que 100% da arrecadação oriunda das multas geradas pela pesca irregular sejam destinados às seguintes áreas: 30% ao Batalhão da Polícia Militar de Proteção Ambiental (BPMPA), para a aquisição de equipamentos que contribuam com a intensificação e ampliação da fiscalização e o combate à pesca predatória nos rios, bacias e mananciais; outros 35% para a Secretaria Estadual do Meio Ambiente (Sema), a serem direcionados ao investimento em capacitação do funcionalismo, compra de equipamentos que contribuam com a intensificação e ampliação da fiscalização, combate à pesca predatória nos rios, bacias e mananciais e, também, para a criação de programas de conscientização da preservação. Os outros 35% restantes deverão ser aplicados na aquisição de alevinos, para o repovoamento dos rios, bacias e mananciais e ainda para a implantação de um programa de despoluição e recuperação das matas ciliares.