Terça-feira, 10 de Dezembro de 2024

ARTIGOS Quinta-feira, 31 de Outubro de 2024, 07:43 - A | A

Quinta-feira, 31 de Outubro de 2024, 07h:43 - A | A

Willer Zaghetto

A tortura-castigo

O legista antes de auxiliar da justiça é médico e como tal precisa honrar com seus deveres éticos!

Ao fim do exame de corpo de delito, em apurações do crime lesão corporal, é preciso que o legista responda os quesitos oficiais, dentre eles se “a ofensa foi produzida com o emprego de veneno, fogo, explosivo, tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou de que poderia resultar perigo comum”.

Em relação ao meio cruel, considera-se que está presente quando se inflige à vítima um intenso e desnecessário sofrimento para alcançar o resultado desejado, revelando a insensibilidade do agente, e que tem como exemplos no dispositivo legal a tortura ou uso de fogo.

Dentre as diversas formas de tortura – sim esse ato não é praticado apenas para se obter a confissão de outrem – tem-se definia pela lei nº 9.455/97 o crime de tortura-castigo.

Este meio cruel é caracterizado pela inflição de intenso sofrimento físico ou mental a uma pessoa sob a guarda, poder ou autoridade do garante, com o objetivo de aplicar um castigo pessoal ou medida preventiva, que causa danos irreparáveis à vítima, tanto físicos quanto psicológicos. Para que o crime seja configurado, ainda é indispensável a presença de violência ou grave ameaça contra a vítima.

Crime próprio, de avanço crescente em nossa sociedade, principalmente em Mato Grosso, um dos campeões nacionais em violência doméstica, geralmente é perpetrado pelo genitor (que ostenta a posição de garante) sobre seu filho, submetendo-o ao sofrimento físico ou mental. Nesse caso, a intensidade do ato se sobrepõe ao crime de maus-tratos, sendo facultado ao juízo, perito dos peritos a desclassificação do crime de tortura-castigo para maus-tratos quando assim julgar procedente.

O legista antes de auxiliar da justiça é médico e como tal precisa honrar com seus deveres éticos. O código de Ética Médica veda ao médico, dentre tantas coisas, “deixar de denunciar prática de tortura ou de procedimentos degradantes, desumanos ou cruéis”, sendo assim, não deve e não pode o perito se esquivar de responder positivamente ao citado quesito, se constatadas as evidências de meio cruel, do tipo tortura, durante a perícia.

Willer Zaghetto é médico pela UFMT e atua como Perito Oficial Médico Legista.