Entre os dias 25, 27 e 29 de agosto, as Defensorias Públicas de Mato Grosso, Goiás e Tocantins realizam a 2ª edição do “Defensorias do Araguaia”, projeto que leva cidadania e atendimento jurídico para as aldeias indígenas Karajás dos três estados brasileiros. Nesta edição, o mutirão percorre quatro aldeias: São Domingos (Mato Grosso), Fontoura (Tocantins), Bdé-Burê e Burundina (ambas em Goiás).
“O mutirão representa um marco institucional para a Defensoria Pública do Estado de Mato Grosso (DPEMT) por materializar na prática o compromisso da instituição com a efetivação de direitos fundamentais de populações historicamente invisibilizadas, como os povos indígenas Karajá. Ao levar o sistema de justiça para os territórios indígenas, a DPEMT ultrapassa barreiras geográficas, culturais e tecnológicas, promovendo o acesso à justiça de forma intercultural, desburocratizada e resolutiva. Mais do que uma ação pontual, o projeto reforça o papel constitucional da Defensoria Pública como promotora de cidadania e justiça social, ao integrar esforços interinstitucionais, escuta qualificada e soluções imediatas, como a realização de perícias médicas virtuais, concessão de benefícios e regularização documental”, afirma o secretário executivo da DPEMT, Clodoaldo Queiroz.
Os atendimentos acontecem da seguinte forma: no dia 25 de agosto, o mutirão será realizado na Aldeia São Domingos, no município de Luciara (MT); no dia 27, o mutirão acontece na Aldeia Fontoura, próximo ao município de Lagoa da Confusão (TO); já no dia 29, o mutirão atende as Aldeias Bdé-Burê e Burundina, no município de Aruanã (GO).
Serão realizados serviços de demandas de previdência social e da Caixa Econômica Federal; orientação, solicitação e análise de benefícios sociais; agendamento e realização de perícia médica; emissão de Certidão de Exercício de Atividade Rural, título de eleitor, carteira de identidade; atendimento médico; orientação jurídica em geral; demandas jurídica para órgãos federais; ações de família como reconhecimento de paternidade, adoção e exames de DNA; retificação de registro civil; audiências pré-processuais; registro no CAD Único.
“As expectativas para esta nova edição são altas e ancoradas na experiência bem-sucedida da primeira edição, ocorrida em 2024. A rede interinstitucional criada permanece ativa, o que permite ampliar o alcance da ação e aprofundar o atendimento às comunidades. Esperamos aumentar o número de indígenas atendidos, consolidar práticas como as perícias médicas no território, fortalecer o vínculo com as lideranças locais e avançar na inclusão das demandas identificadas em políticas públicas duradouras. A continuidade do projeto contribui para o processo de institucionalização dessa metodologia de atuação, garantindo que ações como essa não sejam exceções, mas parte regular da política pública de acesso à justiça, especialmente em territórios vulneráveis e de difícil acesso”, diz Clodoaldo.
Primeira edição – Logo na primeira edição, o “Defensorias do Araguaia” já foi um sucesso. Entre os dias 17 a 21 de junho de 2024, o projeto realizou mais de 1.100 atendimentos. Naquele ano, pela primeira vez em mutirões, o INSS realizou a modalidade de perícia conectada, que é um serviço de atendimento remoto, realizado online que visa facilitar o atendimento, especialmente para pessoas que residem longe de uma agência do INSS. Essa modalidade é uma alternativa para atender segurados em áreas onde não há perito médico disponível.
Quem se beneficiou com o mutirão foi Tejuhare Inã, indígena morador da aldeia de Fontoura (TO). Tejuhare viveu seus 50 anos sem nunca possuir um registro civil. Órfão desde jovem, ele enfrentou desafios significativos sem acesso a serviços essenciais como saúde e transporte, devido à falta de documentação oficial. Sem um documento, ele não podia recorrer a um hospital quando precisava. Em vez disso, enfrentava problemas de saúde utilizando recursos naturais como cascas de árvores, raízes e folhas, disponíveis na natureza ao seu redor.
"Fui à escola por pouco tempo, mas nunca fui registrado. Depois, começaram a exigir certidão de nascimento, mas como não tinha, as coisas foram passando. Agora, estou precisando de muitas coisas. Quando vou ao hospital, me recusam tratamento por falta de documentos. E para viajar de ônibus, não posso sem documento. Não tem nenhum benefício não ter documento”, relatou Tejuhare à época em que participou do mutirão. Por não se comunicar fluentemente no idioma português, durante a entrevista ele contou com o apoio do pastor João Werreria Karajá como intérprete.
Atendido pelo mutirão, Tejuhare finalmente pode emitir sua certidão de nascimento para ter acesso à carteira de identidade e demais documentos pessoais necessários: "Estou muito feliz com a chegada da equipe. É uma mudança na minha vida, estou radiante com a presença de todos vocês", comemorou Tejuhare, que à época disse que sonhava em conseguir um emprego como pescador profissional, viajar de ônibus e ser atendido em hospitais quando necessário.
Histórias como a de Tejuhare marcam o “Defensorias do Araguaia” e demonstram que o projeto vai muito além de levar serviços básicos para comunidades indígenas. A proposta do mutirão é levar dignidade e cidadania para brasileiros que são invisibilizados pelo Poder Público.
O sucesso do mutirão foi reconhecido nacionalmente no concurso de práticas exitosas do XVI Congresso Nacional das Defensoras e Defensores Públicos (Conadep) de 2024, quando o “Defensorias do Araguaia” ficou em segundo lugar na premiação.
O concurso, que aconteceu em novembro do ano passado, visa estimular a pesquisa, reflexão e a produção científica sobre a Defensoria Pública e a sua importância para a efetivação do Estado Democrático de Direito.
“Essa conquista é reflexo direto da relevância social, inovação metodológica e impacto concreto da prática. A articulação entre as Defensorias Públicas Estaduais de Mato Grosso, Tocantins e Goiás, a Defensoria Pública da União e diversos órgãos parceiros é inédita em termos de alcance e coordenação. O mutirão rompe com a lógica fragmentada do atendimento estatal e propõe uma atuação simultânea, intercultural e resolutiva dentro das aldeias. A força do projeto está na capacidade de produzir transformações reais, com efeitos estruturantes e mensuráveis na vida das pessoas atendidas”, garante Clodoaldo Queiroz.
Parceiros – Além das Defensorias Públicas de Mato Grosso, Goiás e Tocantis, também atuam no mutirão:
Advocacia Geral da União; Ministério da Previdência Social; INSS; Perícia Conectada; Funai; Receita Federal; Secretaria Especial de Saúde Indígena; Ministério Público Federal; Defensoria Pública da União; Distrito Sanitário especial Indígena; TRT da 18ª Região; TJGO; 13ª Zona Eleitoral; Ministério Público do Trabalho; Ministério Público de Tocantins; Governo do Tocantins; Governo de Mato Grosso; Politec; Unemat; Assembleia Legislativa de Mato Grosso; Universidade Federal do Tocantis; Junta Militar; Cartório de Registro Civil de Aruanã; Prefeitura de Luciara; Serviço Nacional de Aprendizagem Rural; Prefeitura de São Félix do Araguaia; Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas; entre outras.