O Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) negou apelação cível e manteve a decisão de primeira instância, que acatou o pedido da Defensoria Pública do Estado de Mato Grosso (DPEMT) e determinou que a Universidade do Estado de Mato Grosso (Unemat) implemente a nova grade curricular na licenciatura plena de Matemática, no campus de Cáceres, somente para os alunos que ingressaram no curso a partir do primeiro semestre de 2024.
Desse modo, para os alunos já matriculados deve ser mantida a grade anterior, estabelecida no segundo semestre de 2018, evitando o atraso na conclusão da graduação e, consequentemente, a demora para ingressar no mercado de trabalho, já que o novo projeto pedagógico do curso (PPC) aumentou em até 50% a carga horária de algumas disciplinas.
“A questão não reside na vedação absoluta de alterações curriculares, mas sim na necessidade de que tais mudanças sejam implementadas de forma a não prejudicar aqueles que já iniciaram seus estudos sob determinada matriz curricular, respeitando-se o princípio da segurança jurídica e da confiança legítima dos estudantes”, diz trecho do voto do relator, desembargador Rodrigo Roberto Curvo.
Com isso, o recurso foi negado por unanimidade pela Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo do TJMT, no dia 13 de agosto, mantendo a decisão de fevereiro da 4ª Vara Cível de Cáceres.
Na ação civil pública (ACP), o defensor público Saulo Fanaia Castrillon alegou que a mudança na grade curricular atrasaria o término da graduação dos estudantes já matriculados no curso e o posterior ingresso no mercado de trabalho, além de ferir o direito adquirido dos alunos que iniciaram a licenciatura sob a vigência de outra grade.
“Essa decisão é extremamente importante porque cria um precedente que dá segurança jurídica aos acadêmicos. A maioria dos acadêmicos da Unemat são de classe média baixa e vivem com dinheiro contado para poderem cursar uma faculdade. A alteração da grade curricular, se não for bem elaborada, prejudica sobretudo esses acadêmicos mais vulneráveis, que fizeram todo um planejamento para poder estudar na instituição e que, no meio do caminho, podem sofrer atraso na conclusão do curso em razão da alteração da matriz curricular, podendo, inclusive, levar muitos deles a desistirem do sonho de concluir o ensino superior”, sustentou o defensor.
Em fevereiro, a juíza Henriqueta Fernanda Lima julgou procedentes os pedidos da ação, com resolução do mérito, determinando que a Unemat implemente a nova grade curricular somente para os alunos que ingressaram no curso de Matemática a partir do primeiro semestre do ano passado, fixando prazo de 5 dias para o cumprimento da decisão, sob pena de multa de até R$ 20 mil.
Assim, o valor da multa fixada também foi mantido pelo TJMT, que não vislumbrou que o valor era abusivo, considerando a natureza da obrigação e o porte da universidade.
“O valor se revela adequado ao fim coercitivo a que se destina, sem caracterizar confisco”, destacou o voto do relator.
Entenda o caso – O Núcleo de Cáceres da DPEMT foi procurado, em janeiro do ano passado, por uma aluna matriculada no 6º semestre do curso de licenciatura plena de Matemática na Unemat, no campus local.
Ela informou que quando ingressou na faculdade estava em vigência o projeto pedagógico do curso de 2018, devidamente aprovado pelo Conselho de Ensino Pesquisa e Extensão (Conepe) – órgão colegiado com funções normativas, consultivas e deliberativas sobre matéria didático-científica e pedagógica.
No entanto, a Faculdade de Matemática da Unemat lançou no portal do aluno uma nova edição do PPC, comunicando que a nova grade seria implementada a partir do primeiro semestre de 2024 para os ingressantes do 1º ao 6º semestre letivo.
De acordo com a estudante, a implantação da nova grade curricular geraria sérios prejuízos aos alunos que ingressaram na faculdade na vigência do PPC de 2018, culminando inclusive em atraso na conclusão da graduação e demora para ingressar no mercado de trabalho.
Esse atraso ocorreria porque algumas disciplinas tiveram sua carga horária ampliada exponencialmente, como a Geometria Euclidiana Plana, que até então tinha carga horária de 60 horas, e aumentou para 90 horas na nova grade curricular.
Com isso, os alunos que já cursaram essa disciplina seriam obrigados a fazer mais 30 horas da respectiva matéria, ou seja, 50% a mais, ocasionando choque de horário com outras disciplinas e, por consequência, atrasando o término da graduação.
Além disso, conforme a ACP, a instituição de ensino não seguiu as diretrizes da Instrução Normativa (IN) 008/20210-Unemat, que dispõe sobre os procedimentos de migração de discentes dos cursos de graduação ofertados.
Segundo a IN, a implantação da nova grade curricular só deveria valer para os novos alunos do curso, não alcançando os acadêmicos matriculados anteriormente.
“Art. 11. Todos os discentes que ingressarem no curso, após a implantação do novo PPC, deverão integralizar o total da carga horária do curso e das atividades de extensão conforme consta no PPC aprovado no CONEPE”, diz trecho da instrução normativa.
Na decisão, a juíza pontuou que, embora a instituição de ensino tenha autonomia para atos de gestão, as mudanças na grade curricular não podem prejudicar alunos já matriculados, inseridos em normativas anteriores, e que teriam suas graduações postergadas por situações alheias às suas vontades.
“Dito isto, vale dizer que, em que pese a Universidade possua supremacia para atos de gestão sobre a sua organização e dos cursos oferecidos, tal autonomia, assim como toda regra legal e constitucional, não é absoluta ao ponto de sacramentar direitos adquiridos como no caso em tela”, diz trecho da decisão.